O
Encontro
Samael
pousa na areia do deserto, sob o sol escaldante, com o espírito abatido.
Sacando sua espada flamejante, exclama:
- Batharyal, antigo anjo do Senhor,
destituído de sua graça perante o Pai, antigo servo de Lúcifer, conhecido como jinni do deserto, como pai dos ladrões,
eu, Samael, seu antigo comandante, em nome da essência que nos une, o invoco!
– ao término de sua fala, o anjo caído bate com o cabo de sua espada no chão,
provocando uma onda sísmica que se estende por muitos quilômetros.
Os segundos que transcorrem parecem
uma eternidade. Samael põe-se em pé e fica fitando o mar de areia à sua frente.
De repente, um pequeno redemoinho começa a formar-se diante dele, e pouco a
pouco o vento e areia rodopiantes dão lugar à imagem de um homem com imensas e
frondosas asas cinzentas em suas costas.
- Olá Samael. Ouvi dizer que havia
saído do Vale dos Sentinelas, mas não esperava tão ilustre visita. A que devo
essa honra? – saúda o recém-chegado.
- Olá Batharyal. Receio que minha
visita não seja puramente social. Vim pedir sua ajuda, meu amigo.
- E no que eu poderia lhe ser útil,
após tantos séculos?
- Eu preciso que você me ensine o
caminho para o Inferno, Batharyal. Bem sabes que nunca estive lá e não sei como
chegar ao Abismo.
- E que queres tu por lá? Se é que
me permites tamanha curiosidade.
- Tenho um acordo a propor para
Lúcifer.
- Pensei que já tivessem um.
-
Mas eu quero propor-lhe uma mudança nos termos.
-
Uma mudança nos termos de Lúcifer? Tenho que admitir que és muito corajoso. Ou
burro.
-
Talvez um pouco dos dois. Mas diga-me, vai ajudar-me ou não?
-
Bom, se queres tão ansiosamente buscar sua destruição...
Após
horas de exaustivo voo, Samael afinal enxerga abaixo de si, o vulcão indicado
por Batharyal. Sem pestanejar, mergulha velozmente na cratera, lembrando-se das
recomendações do jinni. Entretanto,
sua velocidade não foi suficiente para escapar de Tiamat, um monstruoso dragão, de três
cabeças e asas de morcego, que o atingiu com imensas e incandescentes labaredas
de fogo que tomaram seu corpo instantaneamente, provocando ferimentos graves e
profundos, preenchendo suas narinas com o cheiro de carne queimada. Suas asas
foram consumidas rapidamente, o que o lançou numa queda vertiginosa e
torturante. A dor era excruciante e parecia que jamais atingiria o chão.
Entretanto, logo seu corpo atingiu o fundo, chocando-se violentamente contra
ele, quebrando-lhe muitos ossos, aumentando ainda mais sua agonia.
- Ora, ora, o
que temos por aqui? – Samael ouve uma
voz grave dizer acima de si, enquanto sente os ossos voltando ao lugar, a pele
e penas regenerando-se, aumentando a dor. Virando-se para encarar seu
interlocutor, deparou-se com um corpulento demônio de asas negras, que segurava
as rédeas de Cérbero, o cão do inferno.
- Astaroth. –
balbuciou, enquanto tentava levantar-se. – Vim para falar com Lúcifer.
- Por que
queres falar com Lúcifer? Deveria estar tratando de cumprir sua missão.
- É
exatamente sobre isso que quero falar com ele.
Erguendo uma
sobrancelha, o guardião dos portões do inferno concorda: - Está bem,
acompanhe-me.
Samael
obedece e ignorando os protestos de seu corpo imortal que agoniza de dor, passa
a seguir Astaroth pelos escuros e tortuosos caminhos que conduzem à região dos
condenados, onde milhares de almas humanas gritam e se debatem, imersas em
eterno tormento. Dias pareceram se
passar, enquanto eles desviavam das almas que imploravam por ajuda e por alguma
espécie de redenção. Quando chegaram às margens do mar de fogo, Astaroth
despediu-se dizendo:
- Só posso
guiá-lo até aqui. Após sobrevoar o mar de fogo, encontrará uma estrada que o
conduzirá até a morada de nossos irmãos.
- Obrigada
Astaroth.
- Não me
agradeça Samael, receio que o trouxe até o local de seu descanso eterno.
Samael acenou
com a cabeça e alçou voo sobre a lava incandescente que separava a região dos
condenados da morada dos jinnis. Mesmo para ele, o calor era
insuportável e o vapor que o líquido exalava queimava suas recém-curadas
feridas, causadas pelas chamas do dragão e pela queda. Respirou aliviado quando
afinal tocou a outra margem e avistou uma estrada de tijolos amarelos que
conduzia a um imponente castelo. Estava cansado, mas recusou-se a parar.
Caminhou decidido até atingir os portões do palácio, aonde havia outro guarda,
que ele também saudou pelo nome:
-
Olá Abramalech. Vim para falar com Lúcifer.
-
Entre Samael, ele o está esperando. – disse o monstruoso demônio, enquanto
abria o portão para que o antigo comandante entrasse.
No
suntuoso saguão interno, Samael encontrou Lúcifer, sentado em seu imponente
trono de jade, incrustado de diamantes e rubi, ladeado por suas quatro esposas:
Lilith, Mochlath, Naamah e Aggarath. As duas primeiras o fitaram com interesse, pois que
ambas já haviam sido suas esposas também há era atrás. Porém, ele não se deteve
a analisá-las demoradamente, ajoelhou-se e dirigiu-se ao senhor do inferno:
- Lorde
Lúcifer, assim como já esperava minha chegada, presumo que já conheça o motivo
de minha visita.
- Sim Samael,
já sei o que vieste buscar e aviso de antemão que perdes tempo. Seus esforços
seriam muito mais bem empregados na busca da realização de sua missão que em
vir até meus domínios importunar-me.
- Mas lorde
Lúcifer, não posso fazer o que me pedes. Não posso ferir a menina...
- Sabe
Samael, foi esse tipo de atitude que o levou a ficar escondido no Vale dos
Sentinelas por séculos, com medo do que eu e seus irmãos poderíamos fazer
contra você. Você tem o péssimo hábito de se apegar aos mortais.
- Longe de
mim questioná-lo milorde, mas também tu não escolheste dentre os mortais, três
de suas esposas?
- Porém
antes, fiz delas imortais poderosas e antes ainda, gerei nelas nefilins que foram
o orgulho de sua raça. Só lhe peço isso, que gere na menina um nefilim macho,
apenas um será o bastante, depois podes fazer dela e de ti o que quiseres.
- Mas e se o
nefilim gerado for fêmea?
- Aí tentarás
uma vez mais, até que finalmente consigas o nefilim que tanto precisamos.
- Mas ela
será perseguida pelos anjos, sabes disso.
- Por isso a esconderemos
aqui, para que aqueles malditos não coloquem as mãos nela.
- Ela pode
ser morta no meio de nossos conflitos ou até mesmo ao dar a luz à criança. Além
disso, sua alma seria comprometida. Não posso correr esse risco. Eu a amo e
desejo viver com ela.
Mochlath
arregalou os olhos e pareceu perder o ar por um instante ao ouvir tal
declaração. Enfurecida, Lilith pôs-se de pé e começou a esbravejar:
- Como ousa
questionar as ordens de meu marido, Samael?
Lúcifer
interveio e ordenou que sua esposa se sentasse, calmamente voltando-se para o
anjo caído, que humildemente permanecia prostrado à sua frente.
- Creio que
tens uma contraproposta a oferecer-me. Gostaria de ouvi-la.
- Eu pensei
em reunir meus filhos a seu serviço. Poderíamos rapidamente criar um exército
de criaturas da noite e usá-los em lugar dos nefilins. Seria um trabalho mais
rápido, mais fácil e que atingiria os mesmos objetivos.
- Seus
filhos? Acaso refere-se aos íncubos e súcubos, aquelas criaturas horrendas às
quais deste origem ao unir-se a minha amada Lilith nos primórdios da criação
quando ela ainda era uma mera mortal?
- Sim,
milorde. Bem sabes que um único íncubo é capaz de gerar dezenas de vampiros num
curto espaço de tempo, seria algo muito mais rápido que gerar hordas e hordas
de nefilins e com o mesmo resultado final.
O antigo anjo
de luz refletiu por um instante, antes de tornar a falar:
- Não vejo
por que eu não poderia ter uma coisa e outra. Poderia ter o exército de
vampiros e ainda a minha legião de nefilins.
- Por favor
milorde, abra mão da menina.
- Samael, os
termos são os seguintes: Ou leva sua missão a cabo e engravida a menina, ou
ordenarei que a tragam até aqui e a entregarei aos meus servos mais fiéis para
que façam o que és incapaz de fazer.
- Não mestre,
eu imploro, isso não!
- Então
concorda em cumprir sua tarefa?
- Não, não
posso comprometer a alma dela. Ela merece ir para o céu.
- Façamos o
seguinte: Nergal, Baallberith, Gadrel e Asmodeu o levarão para as
masmorras, onde terá a oportunidade de pensar melhor sobre esse assunto.
Ao término
dessas palavras, quatro demônios, que montavam guarda nos cantos do castelo,
aproximaram-se de Samael, a fim de aprisioná-lo, porém, o anjo caído não pretendia
entregar-se tão facilmente. Rapidamente alçou voo, buscando atingir uma das
janelas que abria-se lá no alto de um das torres. Contudo, Nergal agilmente
acompanhou seu voo e agarrou seu tornozelo. Samael sacou sua espada e atingiu a
mão do oponente, que o soltou, mas então foi a vez de Baallberith agarrá-lo,
imobilizando suas asas, comprimindo o corpo contra o seu. O anjo caído ainda
tentou atingir o inimigo com a espada, porém, Asmodeu a arrancou de suas mãos.
Não dando-se por vencido, Samael atingiu a virilha deste com o joelho e também
com um soco na cara, fazendo o demônio arquear-se de dor. Por fim, Gadrel
surgiu com uma espada reluzente, feita de aço e transpassou o peito de Samael,
que antes de render-se à inconsciência, ainda teve tempo de balbuciar um nome:
- Ester...
Olá Elaine!!
ResponderExcluirVim retribuir a visita e estou te seguindo!!
Que surpresa tive quando entrei no seu blogue, sou apaixonada por Anjos,(quem não é?) e dei de cara com um conto desses!!
Não conhecia seu trabalho, fiquei encantada!! Parabéns!!
Meu blogue literário está a sua disposição!!
Beijos
Rê
http://entresenhas.blogspot.com.br